Dai aos Gays o que é dos Gays e a Deus o que é de Deus




Carlos Moreira

Na última quinta-feira, através da publicação da revista Veja, nos deparamos com os detalhes da decisão inédita do Supremo Tribunal Federal sobre duas matérias de suma importância para o povo brasileiro.

No julgamento da primeira ação, proposta pelo governo do Rio, o STF reconheceu que as uniões homoafetivas– casais do mesmo sexo – passam a ter os mesmos direitos das uniões de casais heterossexuais. “O objetivo é que os servidores tenham assegurados benefícios como previdência, concessão de assistência médica e licença”.

A segunda ação dizia respeito a uma petição da Procuradoria-Geral da República. Ela reclamava “além do reconhecimento dos direitos civis de pessoas do mesmo sexo, declarar que uma união entre estas pessoas é uma entidade familiar”. Essa decisão, na prática, permite que tais casais possam, por exemplo, adotar filhos ou pleitear que seus relacionamentos sejam convertidos em casamentos.

Polêmicas a parte, pois após a decisão veio de imediato uma reação política quanto à competência do STF de tratar questões que deveriam ser, prioritariamente, conduzidas pelo Congresso Nacional, o que está diante de nossos olhos é o prenúncio de profundas mudanças que se estabelecerão no cenário sócio-cultural-religioso de nosso país. 

Colocados estes pontos, surge à questão central da qual trata este artigo: “e nós, na condição de cristãos que somos, como devemos nos posicionar frente a estas decisões?”.

Antes de qualquer consideração, quero trazer-lhe uma porção das Escrituras: “Ele lhes disse: "Portanto, dêem a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus" Lc. 20:25. Para que você possa discernir a profundidade e as implicações da resposta de Jesus, é fundamental compreender as funções de duas instâncias político-religiosas da nação de Israel em Seu tempo: o Rei e o Sinédrio.

Desde o ano 4 a.C a Galiléia era governada por Herodes Antipas, que reinou até o ano 39 d.C. Ele era um déspota, dono absoluto de tudo, homem que não devia e não prestava contas a ninguém, além de não possuir ética alguma. Mas quem governava de fato a Palestina, desde 63 a.C., eram os Romanos. Herodes era só uma marionete nas mãos do império, um “inocente” útil, uma figura caricata, aparentava ter poder, mas, na verdade, fazia apenas o que lhe era ordenado. 

O Sinédrio, por outro lado, representava o supremo tribunal dos judeus em Jerusalém, uma espécie de senado, e sua influência se estendia tanto a Judéia quanto a Galiléia, além de possuir o controle do Templo. Sua função primordial era julgar assuntos da Lei quando surgia algum tipo de discórdia e sua decisão era final, não cabendo qualquer apelação. O Sinédrio era composto por 71 membros, sendo a grande maioria pertencente ao partido dos Saduceus, os quais representavam o poder, a nobreza e a riqueza. 

Agora vamos voltar ao texto. Se você for ler todo o capítulo, perceberá que a discussão de Jesus é com mestres da Lei, sacerdotes e líderes religiosos. Eles queriam apanhar Jesus em algum tipo de contradição, fato que seria suficiente para levá-lo diante do Sinédrio. Por outro lado, se ele cometesse algum tipo de transgressão civil, poderia ser levado ao rei Herodes e este, por sua vez, o encaminharia para ser julgado pela autoridade romana, no caso Pilatos.

Mas a armadilha não funcionou. A resposta de Jesus deixou todo mundo de “calça curta”, foi um verdadeiro “xeque-mate”: “dêem a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus". Nela nem se podia encontrar violação contra o império, nem muito menos transgressão religiosa.

Eu sempre achei curioso o fato de Jesus não entrar na questão em si, não questionar se o imposto era certo ou errado, justo ou injusto, se seu destino era para realizar o bem ou apenas para servir de instrumento de enriquecimento ilícito de uns poucos. Na verdade, Jesus soube fazer uma dicotomia perfeita: Ele separou a legislação política dos preceitos da religião, e não deixou de pontuar o que era concernente ao Reino de Deus; pôs cada coisa em seu devido lugar!      

Como devemos nos posicionar quanto às decisões do STF? Bem, antes de dizer o que penso, deixe-me trazer uma questão conceitual importante sobre a diferença que há entre o poder do Estado e o “poder” da Igreja.

Citando Gustavo Biscaia de Lacerda, Mestre em Sociologia Política pela Universidade Federal do Paraná, “a separação entre a Igreja e o Estado é um dos princípios basilares do Estado brasileiro e, na verdade, do moderno Estado de Direito. Embora em um primeiro instante pareça que ele refere-se apenas à impossibilidade de o Estado não professar nenhuma fé, ele tem outras aplicações. A separação entre Igreja e Estado não é apenas um princípio negativo, que veda ao Estado a profissão de fé ou à Igreja de intrometer-se nos assuntos estatais; na verdade, o que ele consagra é a laicidade nas questões públicas, no sentido de que não se faz – não se deve fazer – referência a religiões ao tratar-se das questões coletivas”.

“Traduzindo em miúdos”, no Brasil, desde a constituição de 1.891, Igreja e Estado são instituições separadas, que possuem suas próprias leis e jurisdições, e que não podem interferir uma nas ações da outra.

Eu estou certo de que nós teremos muitos protestos, em todo o país, quanto a estas decisões polêmica do STF. Várias instituições religiosas, tanto católicas quanto protestantes, se manifestarão contundentemente de forma contrária. Meu pensamento, todavia, é diferente, e aqui falo por mim mesmo, não sendo representante de nada nem de ninguém a não ser de minha própria consciência.

Parte do texto da ação impetrada pelo governo do Rio de Janeiro diz o seguinte: “... Não reconhecer essas uniões contraria princípios constitucionais como o direito à igualdade e à liberdade, além de ferir o princípio da dignidade da pessoa humana”.

Para mim, há duas formas de um cristão se posicionar frente a estas questões. A primeira é reconhecer o direito do Estado de legislar, de agir de forma justa quanto à coletividade, de buscar o bem comum independentemente de raça, credo, cor, orientação sexual, ou qualquer outra questão que produza diferenciação, exclusão ou acepção.

Se você me perguntar se eu acho que os gays têm direito a dignidade, direito a receber benefícios aos quais, mediante a lei, façam jus, direito a ser tratados com equidade, eu lhes direi que sim, pois penso ser esta uma questão de Estado e que nos remete ao princípio inalienável da dignidade humana. O fato de discordar da forma como vivem do ponto de vista de sua orientação sexual não é motivo para desejar privá-los de seus direitos civis. E mais, acho que eles possuem os mesmos direitos dos adúlteros, dos mentirosos, dos facciosos, dos sonegadores do imposto de renda, dos avarentos, dos egoístas, dos jactanciosos e dos fofoqueiros. Fico por aqui para não ter de citar a lista de todos os pecados que cometemos, eu e você...

A segunda forma de responder a estas questões me retira do âmbito do Estado e me coloca dentro da “jurisdição” do Reino de Deus. Por esta perspectiva, se você me perguntar se um casal gay pode ser considerado uma entidade familiar eu lhe direi que não, pois isto fere um princípio das Escrituras onde Deus estabelece a família como sendo a união entre um homem e uma mulher. Ainda assim, sei que terei de acatar a decisão do Estado, por ser ela de caráter civil, e por ser o Estado laico, mas dou-me ao direito de, na Igreja, pensar de forma diferente, não estabelecendo, assim, tal decisão como parâmetro ou padrão para a comunidade de fé.

Resumindo, eu diria o seguinte: “daí aos gays o que é dos gays e a Deus o que é de Deus”. Não deixarei de pregar que o padrão das Sagradas Escrituras para a sexualidade humana é a união entre homem e mulher, mas também não permitirei que minha consciência seja cauterizada pela caducidade da “letra” que mata em detrimento do Espírito do Evangelho, não me darei ao desplante de "coar mosquitos e engolir camelos", não distorcerei a justiça sendo tendencioso por causa de questões que a Igreja condena, pois quero ser portador da Graça, não do juízo, quero anunciar a Salvação, não a condenação, quero ser instrumento do Amor, não do ódio.

Carlos Moreira é culpado por tudo o que escreve. Ele posta aqui, no Genizah, e também na Nova Cristandade.

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3 comentários:

Sumiumeusblogsnapandemia disse...

Lisane comentou no dihitt e eu lhe disse por lá bem assim: gostei de seus escritos por aqui, em particular lhe dou meus parabéns pela sua coerência e complemento dizendo: Atire a primeira pedra que nunca foi pecador! Mas sei que haverá respostas a essa deixa, mas creiam ou não não vai mudar uma letra do que esta escrito, independentemente do que eu gostar ou deixar de gostar, e a vida seguirá seu curso, com os pró e contra de quem quer que seja, "meus parabéns pelos seus conhecimentos iluminados deixados registrados aqui!"

Fábio Mariz disse...

Oie Sou Fábio Mariz do BLOG => Mariz.Moda , olhando aqui uns blogs, encontrei o seu, adorei assim que vi seu blog e já estou seguido, visite o nosso e seja um seguidor.

#ABRAÇOS

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Roberth Moura disse...

É verdade Marivan. Devemos sim condenar o pecado do homossexualismo, mas devemos respeitar e acima de tudo amar o homossexual, a própria palavra nos diz que devemos amar o pecador, mas abominar o pecado.

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